Freud e o lado oculto da lua


"Educar, ao lado de governar e psicanalisar, é uma profissão impossível."                                                                                                                  Freud

O emprego da psicanálise é relativamente novo nos procedimentos de aprendizagem e educação. Sua aceitação deu-se nos Estados Unidos e Europa, depois - de forma lenta e gradativa - alcançou outros paises fornecendo fundamentos à psicologia, sociologia e, hoje, a psicopedagogia. Por ser um método de tratamento de distúrbios psíquicos através da investigação do inconsciente, sua prática restringia-se unicamente a clínica médica de situações patológicas. Em nosso país, há algumas décadas, a sociedade considerava seu uso perigoso em outras áreas, muito por sua prática questionar idéias, conceitos e imagens pré-concebidas, expondo o homem em seu âmago e revelando a sombra de sua personalidade, o lado oculto da lua.

            Sigmund Freud não dedicou suas experimentações à educação propriamente dita, porém, depois de muito tempo, encontramos em seus fundamentos, a chave para um novo modo de encarar a educação e seu principal alvo; o aluno. No desenvolver de suas teorias queria entender os sentimentos da criança; por que é tímida, apática ou agressiva, contrapondo Piaget que pretendia saber como pensa uma criança. Nos tempos atuais, onde a comunicação é plena e a educação passa por transformações significativas, seria impossível desconsiderar a importância da psicanálise e seu criador no processo desencadeado.

A hierarquia imposta pela sociedade do século XIX e início do século XX não creditava valores relevantes à educação. O analfabetismo não era considerado uma deficiência e os atores desse processo tinham lugares e funções definidas. Com o advento da obrigatoriedade do ensino, este cenário modifica-se radicalmente no todo social, provocando considerável preocupação dos pensadores da época.

A priori, o pensamento freudiano constrói dois modelos de psiquismo, o primeiro que distingue o inconsciente, o pré-consciente e a percepção consciência e o segundo – exposto vinte anos mais tarde – com uma nova diferenciação de instâncias; o id, o ego e o superego. Da primeira instância, o inconsciente é contribuição fundamental, já que são suas forças que trabalham o ego, estado que chancela a estabilidade do ser perante o id, o superego e a convivência natural. O Id como escravo dos impulsos orgânicos e desejos inconscientes comandados pela libido (princípio do prazer) e o superego – crítico contumaz e guardião implacável da consciência moral estabelecida. Dessa forma podemos concluir que nunca chegarão à unidade, a uma identidade definida e em nosso viver travarão permanente conflito.

A construção desse pensamento com enfoque nas transformações sofridas pela educação e sociedade deflagraram relações e transferências de grande significado por parte dos personagens desse teatro. A submissão é questionada e a espontaneidade, tida até então como desrespeito, trará a luz um ser participante, inquieto e curioso que, mesmo não tendo o sucesso imediato de um aluno submisso, terá na vida egressa um desempenho pessoal, profissional e social de maior participação e qualidade. Com um novo status, a escola, além de moderadora moral, passa a desempenhar a função de caminho para o sucesso e ascensão social.

A psicanálise, indiretamente, embasa uma nova percepção crítica do educando e seu comportamento na sala de aula. A motivação, o desejo e a afetividade ganham espaços importantes nas relações entre professor e aluno no todo de sua convivência. Transfere a ambivalência que mescla amor e ódio do dia a dia familiar para o dia a dia escolar. Ainda, por conta das expectativas criadas, detecta e constata uma nova patologia; o fracasso escolar.
A única tentativa de aproximar a psicanálise da pedagogia por método direto aconteceu pelo pastor suíço Oskar Pfister, amigo e colaborador de Freud. Partindo da premissa que o educador deveria atuar como um analista sem perder a consciência do fim intelectual e moral, a experiência esbarrou no contraditório de como proporcionar ao educando o exercício livre de sua expressão, já que essa liberdade estaria pré-estabelecida nos procedimentos e direção tomados. Seria como dar liberdade ao pássaro para em seguida abatê-lo.

O surgimento dos centros educacionais especializados em crianças com deficiências mentais e, ainda, doenças decorridas das neuroses dos tempos modernos como a depressão, o distúrbio do déficit de atenção e hiperatividade são em muito ajudadas pelo método psicanalítico. Tem, em combinação com processos pedagógicos e acompanhamento biológico, alcançado enorme sucesso na integração social dessas crianças, oportunizando que se desenvolvam intelectual e profissionalmente, como, de resto, em sua vida afetiva e interpessoal.

Freud viveu e desenvolveu suas teorias em tempos difíceis, filho de Amália Nathansohn, o segundo casamento do negociante de lã Jakob Freud, nasceu em 06 de maio de 1856 em Freiberg, Morávia (hoje Pribor), atual República Tcheca, na época, parte do Império Austríaco. Forma-se médico no ano de 1881 pela famosa Universidade de Viena. Casado com Martha Bernays teve seis filhos, dos quais em sua área destaca-se Anna Freud - importante psicanalista de crianças que mais tarde formará sua própria corrente de pensamento. Em 1938, por influência de Roosevelt e Mussolini, muda-se com sua família para Londres, fugindo do nazismo que, por considerar a psicanálise uma prática judaica, queima seus livros em praça pública e confisca seus bens. Morre aos 83 anos em 23 de setembro de 1939 em razão de um câncer na mandíbula, doença do qual padeceu durante 16 anos.

No ocaso do século XIX (1896) surge pela primeira vez o termo psicanálise nomeando um método específico da psicoterapia e, hoje, faz justiça creditar a seu criador - o Dr. Sigmund Freud – a alcunha de gênio da humanidade. Como todo gênio viveu adiante de seu tempo e, por isso, num primeiro momento, foi ridicularizado e perseguido. Sua perseverança resultou em uma vasta obra literária que, dividida em estudos, cartas, métodos e análises, procurou mostrar a possibilidade do homem se conhecer e ser melhor; o negativo e o positivo revelado em plena interação. Viveu e relacionou-se plenamente repercutindo suas idéias em todos os segmentos da vida humana. Como um artista galgou popularidade e trouxe termos como narcisismo, complexo de Édipo, castração e sexualidade, entre tantos outros, a rotina do vocabulário de todas as gentes, de modo que, e, em contrapartida, é comum escutar por parte do povo e a sombra de uma dúvida a expressão:
- Freud explica!
Certamente, até o lado oculto da lua!

Marco Araujo

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1 Comentários

  1. Muito interessante, muito atual e o lado positivo e negativo do ser, me faz perguntar, quando haverá equilíbrio disso senhor Freud? Se o negativo é tão pesado e o positivo tão leve, quase imperceptível...

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