MANOEL DE BARROS - O ADEUS A OUTRO GENIAL POETA!


Manoel Wenceslau Leite de Barros nasceu em Cuiabá (MT), em 1916 e faleceu aos 97 anos dia 13/11/2014, em Campo Grande-MS.

Ainda novo, foi morar em Corumbá (MS) e mais tarde iria para o Rio de Janeiro, para fazer a faculdade de Direito. Viajou pela Bolívia e Peru, morou em Nova York, captou em cada um dos lugares por onde passava um pouco da essência da liberdade, que aplicaria em suas poesias.

Apesar de ter publicado o primeiro livro em 1937, o “Poemas Concebidos Sem Pecado”, o primeiro livro que escreveu acabou nas mãos de um policial. O jovem Manoel fez a pichação “Viva o comunismo”, em um monumento, e a polícia foi em busca do autor da ousadia. Para defendê-lo, a dona da pensão em que vivia disse ao policial que o “criminoso” em questão era autor de um livro. O policial pediu para ver e levou o livro. Chamava-se “Nossa Senhora de Minha Escuridão" e Manoel nunca o teve de volta.

Formou-se em Direito, em 1941, na cidade do Rio de Janeiro. E já no ano seguinte publicou “Face Imóvel” e em 1946, “Poesias”.

Na década de 1960 foi para Campo Grande (MS) e lá passou a viver como fazendeiro. Manoel consagrou-se como poeta nas décadas de 1980 e 1990, quando Millôr Fernandes publicava suas poesias nos maiores jornais do país.

Manoel é normalmente classificado na Geração de 45 da literatura. Trabalha bastante com a temática da natureza, mais especificamente, o Pantanal. Mistura estilos e aborda o tema regional com originalidade.

Outros livros do autor são: ”Compêndio para Uso dos Pássaros”, de 1961, “Gramática Expositiva do Chão”, de 1969, “Matéria de Poesia”, de 1974, “O Guardador de Águas”, de 1989, “Retrato do Artista Quando Coisa”, de 1998, “O Fazedor de Amanhecer”, de 2001, entre outros.

Alguns dos prêmios que o autor recebeu: “Prêmio Orlando Dantas”, em 1960, ”Prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal”, em 1969. “Prêmio Nestlé”, em 1997 e o “Prêmio Cecília Meireles” (literatura/poesia), em 1998.

Prefácio

Assim é que elas foram feitas (todas as coisas) —
sem nome.
Depois é que veio a harpa e a fêmea em pé.
Insetos errados de cor caíam no mar.
A voz se estendeu na direção da boca.
Caranguejos apertavam mangues.
Vendo que havia na terra
Dependimentos demais
E tarefas muitas —
Os homens começaram a roer unhas.
Ficou certo pois não
Que as moscas iriam iluminar
O silêncio das coisas anônimas.
Porém, vendo o Homem
Que as moscas não davam conta de iluminar o
Silêncio das coisas anônimas —
Passaram essa tarefa para os poetas.


"Palavra dentro da qual estou a milhões
de anos é árvore.
Pedra também.
Eu tenho precedências para pedra.
Pássaro também.
Não posso ver nenhuma dessas palavras que
não leve um susto.
Andarilho também.
Não posso ver a palavra andarilho que
eu não tenha vontade de dormir debaixo
de uma árvore.
Que eu não tenha vontade de olhar com
espanto, de novo, aquele homem do saco
a passar como um rei de andrajos nos
arruados de minha aldeia.
E tem mais: as andorinhas,
pelo que sei, consideram os andarilhos
Como árvore."

Manoel de Barros in "Palavras" - Do Livro "O fazedor de amanhecer" 

Auto-Retrato Falado
Venho de um Cuiabá de garimpos e de ruelas entortadas.

Meu pai teve uma venda no Beco da Marinha, onde nasci.
Me criei no Pantanal de Corumbá entre bichos do chão,
aves, pessoas humildes, árvores e rios.
Aprecio viver em lugares decadentes por gosto de estar
entre pedras e lagartos.
Já publiquei 10 livros de poesia: ao publicá-los me sinto
meio desonrado e fujo para o Pantanal onde sou
abençoado a garças.
Me procurei a vida inteira e não me achei — pelo que
fui salvo.
Não estou na sarjeta porque herdei uma fazenda de gado.
Os bois me recriam.
Agora eu sou tão ocaso!
Estou na categoria de sofrer da moral porque só faço
coisas inúteis.
No meu morrer tem uma dor de árvore."


Manoel de Barros, in "Livro das Ignorãças", Editora Civilização Brasileira - Rio de Janeiro, 1993, pág. 107 / Ilustração: Manoel de Barros, por Lesma

por Reggina Moon


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